1. namorada

    sexta-feira, 19 de setembro de 2014

    Ser namorada não é fácil. É preciso ser amiga, para conselhos e broncas. É preciso ser mãe, quando se precisa de colo. Ser filha, para ser aconselhada.  Ser mulher para se entender entre quatro paredes.
    A parte difícil está em achar o equilíbrio. Se você passa muito tempo sendo uma coisa, pode não conseguir ser outra. Ser namorada é ter múltiplas personalidades e se tiver sorte, ser amada por cada uma delas.




  2. Sobre ser...

    terça-feira, 8 de julho de 2014

    Sendo branca, heterossexual e de classe média, a sociedade preconceituosa só me atinge por dois motivos: ser mulher e gorda. Gorda, gordinha, grande e etc. O mundo está cheio de gente acima do peso, eu sei, mas não se deixe enganar, a gordofobia (principalmente entre mulheres) é uma epidemia. Meus dedos não são suficientes para contar quantas vezes ouvi frases como "se você emagrecesse seria linda" ou "você tem que tentar um pouco mais pra perder peso" ou a clássica "você tem que comer melhor". Eu como muito bem, obrigada. Aliás, tirando meu vício de Coca-Cola, eu como melhor que muita gente magra e eu não vejo ninguém olhando feio pra elas enquanto comem bolo de chocolate. Ouço milhares de dicas e receitas mágicas para evitar o sobrepeso como se ser gordinho fosse uma maldição (talvez seja). Todas os conselhos de "como ser saudável" nada mais são que eufemismo para "cuidado para não ficar gordo pois ser gordo não é fácil e achamos mais produtivo acabar com a sua autoestima do que repensar nossos padrões". Minha mãe, que sempre foi gordinha, me disse esses dias que o sonho dela era que existisse uma loja de departamento (tipo Renner e Marisa) só com roupas para gordinhas. Pensei bem e na verdade meu sonho é que toda loja de departamento tivesse roupas para gordinhas também. Não deveríamos ter lojas só pra gente, nem mesmo seções separas, que nada mais é que preconceito disfarçado de "moda plus size", quero poder sair às compras com a minha amiga que veste 36 e comprar o mesmo vestido que ela, só que em tamanho 48. Quero que o número G seja realmente G e não um M disfarçado. Quero que façam tamanhos grandes com consciência pois ao contrário do que acham, não somos barrigudas, somos gordinhas nos braços e nas pernas também. Vocês que entendem mais de moda que eu: isso é tão difícil assim? A questão é que é mais fácil pegar um pano branco, fazer dois cortes, chamar de "+ size" e ostentar o quão inclusivos vocês são. Afinal, gordo não compra o que gosta, compra o que serve.
    Ah, a sociedade livre...


  3. o que se deixa e o que se ganha

    sexta-feira, 4 de abril de 2014

    Mudei. Mudei de casa, de cara e de cidade. Deixei a casa da minha mãe, de três quartos, sala de jantar, quintal e varanda e ganhei um apartamento de 45m² no centro de São Paulo. Deixei a proximidade da família e o colo da mãe. Deixei a comida na mesa e a roupa lavada. Deixei as duas horas de trem e ganhei só meia hora de ônibus. Deixei a academia e ganhei caminhadas de noite no Minhocão. Deixei a correria do estágio e ganhei a dedicação à faculdade. Deixei o sonho de ser professora e ganhei o amor de trabalhar com livros  Deixei a companhia de três pessoas e ganhei a companhia daquele que escolhi pra viver junto.
    Deixei quem era e ganhei quem sou.


  4. Da série coisas que qualquer um pode (e deve) entender.

    quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

    Sempre tive minha parcela de problemas com erros de português. Na escola, era exemplo clássico do tipo chatinha-professor-pasquale que saía por aí apontando dedos e corrigindo meio mundo. Quando decidi fazer Letras, assumo, foi pelo simples fato de gostar de português (tanto de literatura quanto da gramática) e não por interesse na reflexão da língua. Imaginem como foi, pra mim, entrar em Letras na Universidade de São Paulo. 
    Meu primeiro ano de faculdade foi como levar um tapa na cara e uma rasteira em seguida. Quando consegui acordar do estado de choque é que percebi como vinha repetindo e defendendo regras que eu mesma não entendia. Estudar preconceito linguístico pra mim, foi como abrir a janela de um quarto escuro pela primeira vez. Iluminador. Acredito, aliás, que todos deveriam ter pelo menos uma aula sobre o assunto. Todo mundo deveria levar esse tapa na cara decisivo na vida de qualquer falante de português-brasileiro. 
    O triste é perceber que nem os futuros professores de português discutem preconceito linguístico em seus 4 (as vezes só três) anos de graduação. Me atordoa saber que milhares de professores formam-se todos os anos sem nunca ter aprendido que discriminar alguém pelo modo como ele emprega a língua não só é preconceito mas também é contraproducente - dizer a alguém que o modo como ele fala é "errado" não faz com que essa pessoa queira aprender o certo, só faz com que ela o menospreze. 
    O problema - ou o começo dele - está exatamente nos anos de faculdade. Universidades que se preocupam com a qualidade de seus profissionais de Letras acabam por não formar alunos interessados no ensino de português  (principalmente em escolas públicas). Esses professores acabam por serem formados, então, por outras faculdades, que nem sempre se apegam à qualificação de um professor de português competente, e é com esse professor que a massa brasileira tem aula todos os dias.
    É esse professor que vai repetir mil vezes para o aluno "burro" que "mim" não conjuga verbo e que "mim ser índio" - já que, claro, é assim que os povos indígenas se comunicam (em português). É esse professor que vai despertar o ódio pelo português em seus próprios falantes. É esse professor que vai fazer com que alunos do Ensino Médio, como eu, achar que têm o direito de dizer ao amigo qual é o jeito certo de usar uma língua que é usada sem nenhum problema desde os dois anos de idade. É esse professor que vai afastar seus alunos do entendimento que a língua é dinâmica e plural, sendo ela usada de diferentes formas sem relação de superioridade entre elas. Não é fácil, eu sei, mas é necessário. 
    Minha esperança é: se eu consegui entender, qualquer pessoa pode.



  5. Quando...

    terça-feira, 18 de fevereiro de 2014




    Queria voltar no tempo. Só um pouquinho. Não é nem para os anos 80 ou pra quando era criança no interior. Queria voltar naquele tempo onde eu era ignorante. Sim, ignorante.  Sinto inveja da menina que eu era, avulsa da sociedade, mas feliz. Quando eu andava por aí inconsciente desse mundo louco e injusto em que vivo. Quando eu e minha irmã ouvimos "olha as gordinhas sexy" (que além de machista é de uma gordofobia extrema.) de um carro cheio de marmanjos e rimos, pois não sabíamos o que fazer. Quando um homem me olhava feio pois fiz alguma coisa errada no trânsito e eu morria de vergonha. Hoje em dia, tudo isso incomoda. Incomoda por quê na minha recente decisão de me mudar com o meu namorado, enquanto ele respondia se tinha gostado do apartamento, eu ouvia comentários sobre ser dona de casa e aprender a lavar roupa.
    Queria voltar naquele tempo quando eu não sabia que até minha família é machista nas pequenas coisas. São as melhores pessoas que conheço no mundo mas ainda acham que é obrigação das mulheres lavar a louça depois do almoço. Não os culpo. Mas me dói. Machuca pois levei vinte anos para perceber coisas óbvias e contestar imposições preconceituosas que me revoltam. Incomoda pois passei mais da metade da minha vida dentro de escolas que me ensinavam equações de segundo grau mas falhavam em explicar que lugar de preconceito é no século passado. Demorei vinte anos para acreditar que qualquer pessoa pode lavar a louça, e que receber cantada na rua não é nenhum elogio (pelo contrário). 
    A questão é: infelizmente não posso voltar. Agora já sei - e ainda tenho muito a aprender - e o estrago já foi feito. Fui arruinada pela consciência e aceitando o risco de ser chata e repetitiva, tenho me recusado a ficar calada diante de questões que antes passariam despercebidas na esperança de assolar mais algumas pessoas com o dádiva do discernimento.